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terça-feira, julho 31, 2007

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Um precipício inevitável me assombra todos os dias, e me vitimo, cambiando minha liberdade por um futuro inexistente, o fim da linha. A poesia tira o amargor, enxuga as lágrimas e cicatriza os remorsos, faz minhas atitudes parecerem ter significância, fazem o amor parecer existir, fazem o ódio se tornar matéria viva. O olhar que surpreende fica emoldurado, a paisagem mentalizada se torna um grande refúgio esperançoso e tudo o que outrora vivia comprimido dentro do cérebro cria forma, através de caracteres num teclado cúmplice, que se registram na virtualidade visível.

Mesmo que eu não consiga fazer um filme, mesmo que eu não viaje pra muito longe, mesmo que não faça um filho, plante uma árvore ou grave um disco, mesmo que minha família não obtenha fruto algum de mim, mesmo que meus amigos desistam de insistir na minha pessoa, mesmo que nada dê certo, afinal, eu sonhei, afinal, eu busquei, afinal, tive minhas maneiras e consegui algumas coisas boas durante a vida...

Creio que ainda me restem alguns anos, talvez décadas de vida, sei que doenças virão, sei que a gravidade cuidará de entorpecer a estética corporal, sei que muitos virão e muitos irão embora, e também, além de tudo, acima das depressões, mudanças de comportamento, brigas, natais, finados e carnavais, acima de tudo, no último ponto, eu alcançarei o absurdo da totalidade, da eternidade.

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