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Multiple-Man

quarta-feira, abril 18, 2012

Espectro

Afinal, o que diabos querem provar?


Que não há mais luz no mundo?


Que não existe mais "leitura de mundo"?


Você pode não acreditar (e nem precisa), mas o que eu vivi desde que saí daquela cesária faz parte de mim e eu analiso tudo, eu digiro tudo o que faço, ouço, vejo e saboreio nessa merda de vida e boto pra fora do meu jeito.


E esse meu jeito muda o tempo todo, conforme vou absorvendo mais coisa, seja ouvindo uma conversa no ônibus, seja lendo algum clássico numa biblioteca qualquer ou seja rindo no bar com meus amigos.


Só não dá pra sabotar a mim mesmo.


Isso ninguém vai conseguir.


Desiste e vem tentar comigo?

quinta-feira, fevereiro 02, 2012

Errado

abortinhos
ambulantes
permeiam
as madrugadas
e insistem
em permanecer
como espectros
malditos 
assombrando
os tão nascidos
os tão vívidos
os tão amamentados
que os abominam
mas fingem
que não são 
abortinhos
ambulantes

terça-feira, janeiro 24, 2012

Afinal

Mas, ninguém perguntou...

A importância de algo que dizes é realmente importante?

A desimportância está simbioticamente unida à importância.

O mesmo caldo final. A mesma proporção enquanto produto comunicativo.

O lance é: queremos importar. Mesmo que desimportante.

Não necessariamente somar, ou contribuir, ou entender, ou compartilhar.

Nós queremos mostrar o que vemos e como aquilo tudo entra e sai de nossa alma.

Um dia, dois, uma centena de dias e muitas coisas vêm aos nossos olhos.

Essas coisas são filtradas, e as recebemos de acordo com nossa vaidade e atenção.

Depois, as processamos, e as jogamos, em alvos ou aleatoriamente.

Elas rebatem, quicam no chão e param, ou são ignoradas. Mas saem.

Expurgo, logo quero existir.

domingo, janeiro 08, 2012

Nêgo Tôrto

Carros batendo, bebês morrendo, pessoas falando merda, gritando, intolerantes. Minha azia ataca. Não tem cerveja. Estou empapuçado com tudo isso e o lugar onde quero viver parece distante. Estou em casa, mas não me sinto em casa.

Faço gente rir, mas elas gritam comigo e não sabem o que eu quero. Eu as olho, percebo mil coisas e as condeno, mesmo eu sendo assim, preenchido com desgraças e inoperâncias.

Eu quero a verossimilhança, eu quero a verdade e encontro violência, hostilidade, mentira e euforia barata.

Eu quero razão, e encontro uma vida estúpida sendo clonada a cada casa vizinha, a cada pedrestre na rua e a cada opinião compartilhada nas linhas que surgem à minha vista.

As doses de serenidade e alegria que tenho são boas, mas estão perdidas nesse foço torpe, nessa superfície amaldiçoada e esquecida por nós mesmos.

O que eu quero é muito simples, mas é difícil. Tornou-se difícil. Complicaram, mutilaram, atordoaram com a fé e tudo mais que me dizem para crer, fazer e seguir.

Penso que jamais serei compreendido. E às vezes eu só quero um jarro de chope, boas risadas e um abraço amigo.

Nem meus cigarros me deixam mais fumar em paz. Nem minhas idiotices me deixam mais dizer. Querem que eu seja eles, e eu só quero ser eu.

Não ofendo, não faço mal, não tiro nada de ninguém. E isso parece feio, amoral, anormal e fora do padrão. Querem que eu seja eles. Eu não tenho alternativa a não ser a realidade que eu cultivei desde que aqui existo.

O que vi, vivi, senti e compreendi é de direito meu. Sou esse, e não outro. Não quero me adaptar, só quero coexistir com respeito para que, pelo menos, eu não sinta mais raiva e angústia cada vez mais maximizadas por não poder respirar.

É muita crueldade, é muito horror jorrando pelos segundos do cotidiano. Eu vejo múmias, zumbis e fantasmas ao meu redor. Meus parentes, que me cercam, não fazem ideia do que sou. Já não espero nada deles.

Olho pra esse deserto, e olho pro mundo sem gente. Esse último me parece mais acolhedor, mas não é, pois também sou gente, e à gente eu pertenço.

Um carma cruel, um fatídico destino de ser humano, pensante, materialista e concreto, numa roda gigante. Mendigo a cada instante meu alento, meu socorro e meu canto reflexivo. E bizarramente, ainda quero ficar aqui, ainda quero dizer muita coisa.

Me sinto doente, mas me sinto real, sendo expulso de todos os grupos, clubes e cafés da ideologia. Vou me moldando sendo cada vez mais singular e real, numa oprimida, porém obstinada saga numa terra louca, cheia de abismos e abominações. É aqui que vivo, é aqui que percebo e compartilho.

Enquanto não houver outro lugar, vou insistir em perder o que tiver que peder e esquecer o que tiver que esquecer para continuar minha sincera e dolorosa viagem, até que não mais pense, e finde minha jornada aqui.

terça-feira, janeiro 03, 2012

De Demóstenes a Datena

O assunto. O barulho. A opinião
Eu quero saber, e de uma maneira ou outra, busco.

Pergunto, deduzo, mastigo o que me dão de informação e crio meu produto opinativo.

Você faz o mesmo, e a gente se tromba. Começa a troca.

Eu jogo pra você, e você pra mim. Muitas vezes eu jogo e você não pega, e vice-versa.

Mas botamos pra fora o que tínhamos pra dizer. Assim fizemos.

Saímos, cada qual pro seu canto, com uma sensação de semi-satisfação.

Fizemos nossa parte. Dilaceramos o acontecido, a notícia, a pauta do cotidiano, do qual nós, cidadãos pensantes, fazemos parte.

Queremos entender o que vivemos, onde vivemos e pra quê vivemos.

E como fazemos isso... isso varia muito, pois cada um tem seu próprio par de pés, olhos e ouvidos.

Onde eu pisei, olhei e ouvi. Tudo muda o que tudo vejo, entendo e disserto.

Buscai primeiro e entregai depois. Buscar o que e entregar para quem?

A eloquência. A sabedoria. A intuição.

segunda-feira, dezembro 26, 2011

(In)operante


Uma mentira para uma verdade,
Uma concordância para uma discordância.
Uma punheta para uma transa.
Todo mundo palpita.
Todos gozam com o tesão alheio.
Grita. Esperneia. Açoita.
Concorda. Aplaude. Abraça.
Chama. Apalpa. Estupra.
Procura o que não há. Ou o que não deve haver.
Pelo bem do humano, eu olho e bocejo.
Brocho só de olhar. 
E chamo uns pra vir aqui comigo, não fazer nada.
Encher a cara comigo, enquanto todos se mutilam.
Enquanto todos gargalham e tropeçam em seus vômitos, eufóricos.
Eu participo da quermesse, mas não vou às barracas.
Eu olho pro palco, mas não aplaudo.
Eu ajudo a limpar o chão, e não recebo nada por isso.
Eu dou as mãos a eles, mas não rezo e digo um amém fatigado.
Amém para que seja tranquilo.
Amém, mesmo que seja o fim.